O recente decreto do governador Cláudio Castro, remanejando R$ 2,7 bilhões do Fundo Único de Previdência Social (RioPrevidência) para quitar dívidas do Estado com a União, é mais um capítulo sombrio na gestão financeira do Rio de Janeiro. O ato, que subverte a destinação original de recursos provenientes de royalties do petróleo, é não apenas um golpe contra os servidores públicos, mas também uma afronta à confiança da sociedade em seus governantes.
A origem desses recursos não deixa dúvidas: deveriam ser destinados exclusivamente ao pagamento de aposentadorias e pensões dos servidores fluminenses, pessoas que dedicaram anos de trabalho ao serviço público. No entanto, a transferência para o Tesouro Estadual transforma o direito adquirido desses trabalhadores em uma moeda de troca para equilibrar um orçamento mal gerido. Essa atitude reflete a priorização de dívidas externas em detrimento da segurança financeira de milhares de aposentados, que agora vivem sob a ameaça de não receberem seus benefícios.
O argumento de "fechar as contas" para 2024 é insuficiente e irresponsável. Governos estaduais, como qualquer entidade administrativa, têm a obrigação de planejar e gerenciar recursos sem recorrer a práticas que comprometam áreas essenciais, como a previdência. Além disso, a manobra levanta questões sobre prioridades: se há R$ 4,9 bilhões a serem remanejados, por que não buscar renegociações com a União ou outras fontes de financiamento menos prejudiciais ao funcionalismo?
A inércia judicial também precisa ser questionada. Embora deputados de oposição, o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado tenham acionado o governador na Justiça, a demora em julgar o caso só agrava a situação. Essa lentidão reforça a sensação de impunidade e deixa servidores e cidadãos à mercê de decisões arbitrárias. A morosidade em barrar ações potencialmente ilegais mina a confiança da população no sistema jurídico e cria precedentes perigosos para futuras gestões.
Mais do que uma questão administrativa, esse episódio expõe a fragilidade de uma classe política que, ao invés de proteger os interesses de sua população, opta por remediar problemas com soluções paliativas e predatórias. É urgente que a sociedade fluminense cobre transparência, planejamento e respeito. O que está em jogo não é apenas o pagamento de aposentadorias, mas o futuro da relação de confiança entre Estado e cidadão. Se permitirmos que manobras como essa passem despercebidas, qual será o próximo direito a ser negociado?
Coluna de Berenice Seara, do site Tempo Real.